sexta-feira, 12 de julho de 2013

POLÍTICOS E CHÁ DE SEMANCOL

Tereza Halliday – Artesã de Textos
 
 
 
 Ao fim da Segunda Guerra Mundial, amigos conversavam na esquina da famosa confeitaria Sertã, no centro do Recife, onde se discutia de tudo. Foi quando alguém perguntou: “O que você faria se encontrasse Adolf Hitler frente a frente?” O jurista Barreto Campelo respondeu, resoluto: “Não lhe apertaria a mão!”. Como gentleman que era,  negar um aperto de mão era a suprema expressão de repúdio e asco por alguém. Esta história foi contada em sala de aula por meu professor de Jornalismo, Luiz Beltrão.  No rastro das lembranças da faculdade, também este aforismo de outro saudoso mestre, Pe. Aloísio Mosca de Carvalho, S.J.: “Quem merece de Deus os dias e as noites, merece de você um bom dia, um desculpe, um obrigado”.  Ao que minha mãe acrescentava: “E um aperto de mão”.
 
Fui ensinada a não negar aperto de mão a ninguém, mesmo que, depois, tivesse de lavar bem as mãos. Se, por ditames de cortesia ou caridade cristã, eu  apertasse a mão de um desses políticos que emporcalham a democracia, logo procuraria uma pia com água e sabão. Certa vez, jantei calada ao lado de um deputado. Meu desejo era perguntar-lhe: O que o senhor está fazendo para merecer o altíssimo salário que lhe pago? Não o fiz, em respeito à nossa anfitriã comum. Deve ter sido insuportável para ele eu não lhe dar atenção. Políticos detestam ser ignorados. E, até recentemente, pensavam não ser detestável ignorar as necessidades mais comezinhas dos eleitores que os sustentam no Poder: saúde, educação, transporte, vida urbana e rural de qualidade.
 
Nas manifestações populares que eclodiram recentemente por todo o Brasil está implícita, simbolicamente, uma colossal recusa em apertar a mão dos que administram mal e porcamente o nosso dinheiro, recolhido sob o significativo nome de “imposto”.  Repúdio e asco dos manifestantes pelos legisladores e gestores municipais, estaduais e federais, com as sempre honrosas exceções. Por que os responsáveis por nossos impostos e bem estar estão espantados e contrafeitos com os protestos, fruto de profundo desgosto da população com os péssimos serviços prestados?  Porque tardaram demais a tomar chá de Semancol e, agora, são forçados a fazê-lo.
 
Aos leitores de além-mar: “semancol” é um neologismo brasileiro que designa, com humor e ironia, suposta erva que cura a incapacidade de “se mancar”, ou seja, dar-se conta de que certo comportamento é impróprio e inaceitável.
Diário de Pernambuco, 1/7/2013)
 

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